segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Ferrinho de Engomar

 
 
Ferrinho de Engomar
 
Aqui nesta casa, situada em plena Rua Extrema (agora Rua João de Deus) onde eu fui várias vezes, morava aí um colega meu na(s) Escola(s) - Primária e Secundária.
 
Esta Rua, durante muitos anos, foi objecto de cheias: bastava cair um pouco mais de chuva e lá andava o pessoal a meter os taipais nas portas.
Ele morava no primeiro andar, e francamente não sei como era no rès do chão porque a entrada dessa casa era do lado da Rua Almeida Garrett, mas lembro-me que uma vez ele me mostrou as marcas na parede e que praticamente a água chegou até ao bordo do segundo lance da escada (para aí 2 metros, talvez).
 
Esse problema foi resolvido não sei bem como, normalmente a Escola Primária logo em frente não tinha grandes problemas, mas estas casas estavam no seu enfiamento todas elas abaixo do nível normal do solo.
 
Ora, aqui nesta esquina, onde estão agora os contentores do lixo, havia uma casinha, baixa, em triângulo, que ocupava precisamente o espaço de esquina que leva até ao final do agora baldio (provavelmente entretanto já ajardinado) e que era conhecida como «ferrinho de engomar» dada a sua forma e tendo em atenção a forma dos ferros de engomar.
 
Durante as minhas andanças perdi-a de vista mas quando revi o local anos depois já ela lá não estava. 

Estradinha Funda

 
 
Estradinha Funda
 
A escritora farense Lina Vedes tem um texto sobre a Estradinha Funda (aqui: http://www.raizonline.net/duzentosedoze/dozeaaa.htm) (este link já não funciona, as nossas desculpas) e a imagem que apresentamos acima foi-nos fornecida pela Lina Vedes e representa a dita Estradinha numa altura recuada, provavelmente já distante do período de «má fama» da mesma, mas ainda no estado lastimoso em que muitos a conheceram.
 
Eu passava ali para ir à nespera nas Hortas e já contei algures que a GNR ia patrulhar por aqueles lados e tinha o triste hábito de enfiar com os cavalos por aquele estreita «estradinha» e que para nosso azar constante entrava em baixo quando nós estávamos quase a chegar ao fim dela.
Tinhamos de recuar correndo porque o espaço era curto e não dava mesmo para encostar à parede sequer e a eventualidade de ser pisado pelas patas de um cavalo não era assim tão remota nem desejável.
 
Ora, fiz uma foto (Google) da entrada actual da Estradinha Funda e pode verificar-se que aquilo que se alterou nela em cerca de 30/40 anos foi o facto de terem colocado portões deste género (em baixo é igual) embora haja uma vantagem que inibe, pelo menos, o seu uso: a vizinhança de uma habitação, aqui em cima (Santo António do Alto).
 
Quanto à parte de baixo não há qualquer vizinhança inibidora e as ervas e troncos de pequenas árvores são praticamente uma selva virgem.
   

Casinhas perto do Estádio S. Luís (Bairro Centenário)

 
 
Casinhas perto do Estádio S. Luís (Bairro Centenário)
 
Estas casinhas baixinhas, com uma arquitectura antiga e já com muitos anos de existência, estiveram para ir abaixo quando da construção dos desproporcionados blocos da Chasfa em frente.
 
Segundo informações que terão sido dadas pelo responsável da Chasfa na altura e depois Presidente da Câmara Luís Coelho, num debate pré-eleitoral que teve lugar no Teatro Lethes aqui há uns anos, estas habitações têm à volta de 5 vezes maior densidade populacional do que aquilo que é actualmente permitido por lei. Mas na altura da construção estava tudo legal...
 
De qualquer forma, o que interessa é que estas casinhas acabaram por ficar aqui, proporcionando um contraste (pobre) com os enormes blocos ao fundo, mas são um dos últimos resquícios da habitação tradicional naquela zona.
 
Foram arranjadinhas, algumas estavam mesmo muito maltratadas e não sendo uma grande lufada de ar fresco no sítio, sempre dão um jeito...

 

Casa do Nugas

 
 
Casa do Nugas
 
Esta casa que se vê aqui à esquina, coberta a azulejo, no cruzamento entre a Rua do Bom João e a Rua Antero de Quental foi a casa do Sr. Nugas, que teve um estabelecimento de barbearia na Baixa (Largo Terreiro do Bispo com Rua Filipe Alistão) que foi um centro importante de convívio, como eram muitos barbeiros tradicionais.
 
O Sr. Nugas vendia também lotaria que tinha exposta nas vidraças e eu apenas via a sua chegada a casa, numa lambreta, que tinha na altura. Não me parece que tenha estado muito relacionado com o bairro, em si, não me recordando eu da sua presença na Sociedade os Bonjoanenses que era o centro aglomerador da vizinhança na altura (anos 50/60).

 

Recordações de uma casa amarela

 
 
Recordações de uma casa amarela
 
A casa amarela, entaipada, que se vê na imagem entre dois blocos de moradias de construção mais recente tem uma história e com o decorrer dos anos é bem capaz de ficar na história de Portugal mesmo.
 
Esta casa esteve ocupada, a seguir ao 25 de Abril, por pessoas regressadas das colónias e não só, algumas delas já residentes no prédio antes do processo de ocupação.
 
Não conheço o processo em detalhe mas sei que houve luta feroz da parte dos ocupantes e que na altura o MFA teve de intervir também quando se vislumbrava o despejo.
 
O pessoal que aqui vivia foi alojado na sua maior parte no «famoso» Bairro ainda Provisório (há 35 anos sensivelmente) da Horta da Areia, construído com casas em madeira. Ora tudo isto teve lugar por volta de 1977/78, mais ano menos ano.
 
Conseguido o despejo e o alojamento das pessoas que lá viviam tudo levaria a supor que neste lugar nascesse um novo prédio e, pela celeridade então imprimida ao processo, despejo/realojamento, eu já antevia a chegada dos camiões da construção assim que a última cadeira saísse do prédio.
 
Pois...35 anos depois continuo a antever isso...

Escola de S. Luís

 
 
Escola de S. Luís
 
Uma parte substancial dos alunos de Faro andaram aqui nesta escola, uma vez que só havia mais a Escola do Carmo e a da Sé, que eu me lembre.
 
No meu tempo de criança lembro-me de ter havido uma escola primária no Bom João, a duas ou três portas a seguir ao Beco para cima já na Rua Ataíde de Oliveira, isto depois de o João Manjua Leal, numa tertúlia nos Bonjoanenses ter referido que deu aulas um pouco lá mais para os lados da Casa dos Rapazes.
 
Neste caso, da Rua Ataíde de Oliveira, não sei como mas a professora acabou por ficar com a casa e abriu uma mercearia passando a denominar-se «Mercearia da Vizinha» em vez de Escola Primária do Bom João.
 
Esta mercearia que refiro passou depois para uma garagem que já tinha sido oficina na Rua José de Matos (ao lado da casa dos Brito) e que foi abandonada pelos mecânicos Brito familiares entre si, e dos que ficaram,  devido ao seu êxodo para a Venezuela.
 
Segundo o Montarcílio Estrela me disse há tempos estes fizeram uma grande festa de despedida como era uso na altura, coisa que eu não sabia, do uso das festas de despedida. No meu tempo quem emigrava ia «a salto» para França maioritariamente pelo que nem sequer se dizia que se estava de partida.
 
Passando a piada e voltando à Escola de S. Luís a minha maior forte recordação é do primeiro dia de aulas em que os alunos eram quase tantos como as mães que lá estavam a despedir-se deles.
 
No meu caso e de muitos outros isso não se passou: uns quantos dias antes disseram-me (a minha mãe) «é aqui!» embora eu já soubesse, no dia 8 de Outubro meteram-me a malinha nas mãos e disseram-me «está na hora» e tudo correu muito bem.
 
Eu estou a gozar um pouco com isto das mães e dos filhos serem entregues por mão própria na Escola mas anos mais tarde vim a conhecer o problema: tive de levar a minha filha três vezes à sala de aula para a conseguir lá deixar ficar.
 
Como resumo, deste longo texto: uma escola não são só as paredes, o recreio e os professores; é também um conjunto de recordações.
 

Stand Mavico

 
 
Stand Mavico
 
Aqui é ainda, mas ao que suponho com materais de venda diferentes de há 30/40 anos, o - ao que me lembro -  primeiro Stand de motorizadas originais em Faro, se descontarmos um outro que houve na Rua General Humberto Delgado, da Cocciollo e /ou Pachancho que não eram motorizadas (motociclos) com motor a três tempos.
 
Em rigor a Mavico, por aquilo que soube, não era uma fábrica de motorizadas, mas sim uma fábrica de montagem de peças de motorizadas que através de modelos próprios exteriores na embalagem (carroçaria se quisermos) conseguia ter os seus modelos próprios, trabalhando com materais produzidos noutras fábricas e nomeadamente com a Famel de Agueda, cuja porta é logo ao lado mas só apareceu depois, também segundo me lembro.
 
A «febre» das motorizadas teve o seu apogeu por meados dos anos 50/60 do sec. passado e à volta dela foi criada uma estrutura com relações de dependência de sub-tratadores, tal como vendedores de pneus, oficinas de reparação, etc.
 
Hoje praticamente não há motorizadas, ou há muito poucas comparativamente com esse tempo, sendo mais usada a lambreta, que curiosamente no tempo inicial em que apareceu não conseguiu vencer em termos de vendas estas. Fá-lo agora...

 

Casa Espírito Santo

 
 
Casa Espírito Santo
 
Ora aqui, esta casa de esquina, aqui pintada de castanho meio-escuro, fica em frente à casa que foi uma Escola Primária no Bom João (embora agora já não esteja lá, nem a Escola nem a casa: está um prédio com 4 andares), morou, segundo a minha memória o Paulo Espírito Santo (vulgo Paulito e Paulinho) a respectivos pais.
 
Mas, segundo o Mauricio Severo Domingues (ver aqui: http://www.facebook.com/photo.php?fbid=530719600302690&set=a.314143928626926.71102.310830955624890&type=1&theater ) e cito «Em frente da Escola, na casa do canto, residia o Capitão Leote, pai do actual também Capitão Eugénio Boal Vieira Leote e duas filhas , ambas já falecidas.».
 
Assim teremos que antes da família Espírito Santo terá aqui habitado a família Boal Vieira Leote.
 
Pois bem, eu não me lembro de alguém outro morar naquela casa o que me leva a supor (com elevado grau de certeza) que pode ter havido um lapso de tempo em que a família do Capitão Leote lá tenha morado e eu não ter dado por ela e a razão é simples: eu só dei pela família Espírito Santo lá morar porque esta tinha um filho da minha idade, mais um ano ou dois salvo erro.
 
No enfiamento deste renque de casas vê-se a seguir uma casa, agora coberta de azulejos e que na altura era de arquitectura semelhante à da esquina aqui referida (embora sem varanda) que foi a casa dos avós do Luís de Camões que ainda por lá passou salvo erro um ou dois anos e ia lá visitar os avós, embora morasse na zona do Pé da Cruz.
 
Mais abaixo e à esquina será então uma casa já aqui falada (ver aqui: http://www.facebook.com/photo.php?fbid=528065633901420&set=a.314143928626926.71102.310830955624890&type=1&theater ) que foi onde morou o Carlos Gomes e posteriormente o Manuel Adanjo Inácio.
 
Esta casa da esquina ainda hoje é da família Espírito Santo tendo lá vivido uma filha até há bem pouco tempo e continua a ser mantida por um ou mais netos (não estou certo neste ponto).
 
A família Espírito Santo era o objecto inicial desta foto que tinha em carteira devida a três particularidades podendo elas não serem muito importantes para outros, mas que para mim são o fio da meada memorial: a mãe do Paulito era de origem brasileira e durante os cerca de 15/20 anos que a conheci ali manteve sempre o sotaque brasileiro (Dª Inês se chamava).
 
O pai do Paulito parece-me que era bancário, nunca soube exactamente o que ele fazia, mas sabia que ele tinha um carro (anos 50 talvez) que a ser mantido no estado em que ele sempre o manteve, hoje valeria seguramente uma pequena fortuna.Tinha-o numa garagem na Rua Pedro Nunes, logo acima e só o retirava quando tinha de viajar. Era mesmo um belo carro!!
 
O Paulito cresceu, foi para Lisboa, ainda veio cá uma vez ou duas mas acabei por o perder de vista. Andou no Liceu de Faro.
 
  

Legião Portuguesa

 
 
Legião Portuguesa
 
Aqui neste edifício foi a sede farense da Legião Portuguesa, organização cuja função e posição no quadrante político do Estado Novo nunca entendi muito bem.
 
Colavam cartazes da União Nacional, faziam acções de informação sobre Defesa Civil e contra catástrofes (como reagir a um sismo, por exemplo), levavam cinema propaganda aos locais, cidades e aldeias nomeadamente sobre controle de natalidade para os mais pobres, apresentavam os bichinhos da higiene pública ao detalhe sendo muito gozados quando referiam a fauna púbica e enfim, tinham uma estrutura militar por aquilo que percebi porque o legionário para emigrar tinha de pedir licença e obtê-la.
 
Conheço uma pessoa que foi para a Alemanha sem dar cavaco e depois sentiu-se muito receoso para regressar a Portugal de férias o que só veio a fazer depois do 25 de Abril.
 
Tinham umas fardas extraordinariamente verdes (nunca vi um verde tão verde) e faziam exercícios de defesa civil do território com sacos de areia e estavam nesses exercícios encarregados de encaminhar as pessoas para os abrigos anti-aéreos.
 
Não era nada conveniente no entanto dizer-se em frente de um legionário que não se era adepto da União Nacional.
 
O partido socialista ocupou o local logo em 1974, pelo que sei, e por lá se tem mantido. 

Anexo da Estalagem Caíque em Olhão

 
 
Anexo da Estalagem Caíque em Olhão
 
Esta casa que aqui se vê, um «apalaçado» seguramente devoluto e com grandes hipóteses de não ser recuperado senão para uma subida em flecha, foi durante algum tempo um Anexo da Estalagem Caíque, que depois foi Sol e Mar ou coisa que lhe valha e foi o primeiro Hotel de jeito que houve em Olhão nos anos 60/70.
 
Tinha 35 quartos e quando enchia (porque enchia no Verão) as pessoas eram direccionadas para o Anexo, quando queriam, é claro.
 
Tinha no entanto um problema de casas de banho, esta casa, (só tinha duas) e não havia água corrente nos quartos, pelo que era engraçado ver o tradicional lavatório, com jarrinho com água e bacio e a toalhinha pendurada em cada quarto.
 
Nota: fica no cruzamento da Rua 18 de Junho com uma rua cujo nome me não lembra e não se consegue ver na placa.

sábado, 24 de agosto de 2013

Memórias: Benje, o melhor guarda redes do mundo

 
 
Memórias: Benje, o melhor guarda redes do mundo
 
Quando a bola estava longe, a sua presença lembrava mais a de um velho sábio africano, cansado das duras batalhas. Quando a bola ou os adversários invadiam, por alto ou pela terra, a sua área, ai ele virava pantera ou gato negro, felino, com uns reflexos espantosos, voando para as chamadas defesas impossíveis. Jogou entre os anos 60 e 70 (Farense, Varzim, Leixões...) e era... o melhor guarda redes do mundo!.
 
Na baliza, quando a bola estava longe e dava uns passos no meio da grande área, a sua presença lembrava mais a de um velho sábio africano, cansado das duras batalhas que travara no passado, do que a de um felino voador.
 
Não sei se esta imagem balzaquiana me ocupa a mente devido a só o ter visto, com olhos de ver, já na fase terminal da sua carreira, as ultimas quatro-cinco épocas, mas a verdade é que, logo por cima dessa imagem, se sobrepõe outra, muito mais forte, que emerge quando recordo a sua reacção quando a bola surgia na sua área, por alto ou com avançados isolados ávidos por o fuzilar.
 
Aí, o gigante Benje, virava gato negro, felino, voador, com uns reflexos espantosos, executando, com eficácia e beleza estonteante, as chamadas defesas impossíveis. Por ser negro, algo ainda hoje pouco comum, nos guarda redes que jogam na Europa, todo aquele aparato tinha ainda uma maior dose de magia feiticeira, como se fosse dono de qualquer segredo africano. Mesclava o inestético com o espectacular e criava um estilo único e deslumbrante. Como fez quase todas a sua carreira por clubes ditos pequenos (Varzim, Farense, Leixões...) daqueles que jogam para não descer de divisão, num tempo em que as diferenças entre as equipas em Portugal era gigantesca, as suas sucessivas grandes exibições adquiriam contornos verdadeiramente épicos.
 
Entre elas, recordo uma que assisti ao vivo, no repleto Estádio do Mar, numa tarde com o sol a pino, em Matosinhos, num Leixões-FC Porto, por volta de 1976, que tentei seguir, avidamente, procurando ver por entre a multidão, toda de pé, que seguia hipnotizada o jogo. As imagens que retenho desse hoje estão-me gravadas na memória e (curiosamente, não sei porquê, para além de uma série de cruzamentos para trás da baliza, de um careca lateral portista chamado Taí que, nesse gesto técnico falhado tanto irritava os adeptos azuis e brancos) todas elas estão relacionadas com as espectaculares defesas em voo de Benje. E como ele voava, naquele seu tradicional equipamento cinzento.
 
O jogo terminaria com uma grande vitória do Leixões por 0-0. É verdade, leu bem, não me enganei, o resultado final foi mesmo esse e nessa altura empatar com um grande era como uma vitória para essas pequenas equipas, sobretudo na rivalidade que opunha Leixões e FC Porto..
 
Benje pertence, indubitavelmente, ao universo mágico do futebol português, num tempo em que o império ia do Minho até Timor, ele era, vindo de Angola, como um símbolo desses enorme legado ultramarino que tantas glórias e grandes jogadores, brincas na areia, engraçados e fenómenos, deu ao nosso futebol.
 

A última vez que ouvi falar dele foi, salvo erro, em 2001. Era então funcionário fiscal da Câmara Municipal de Faro, onde se radicara finda a carreira. A beleza do seu estilo pode ser, em parte, apreciada na foto que encabeça este artigo, datada de 1973, num jogo contra o Benfica no velho Estádio da Luz, quando, defendendo as redes do Farense, voou, destemido, para roubar a bola dos pés do ponta de lança do Benfica chamado... Artur Jorge.
 
O homem que melhor definiu a categoria de Benje foi, no entanto, um famoso e precursor treinador que marcou uma época no nosso futebol, pelo sua juventude irreverente, discurso diferente, caustico e que, ainda hoje, estaria muito á frente da maioria dos treinadores que ocupam os bancos da Super Liga.
 
Era Joaquim Meirim e a história sucedeu quando treinava o Varzim, no inicio dos anos 70, e o guarda redes suplente (confesso que não me lembro o nome) andava sempre muito chateado porque nunca jogava. Nem um minuto sequer.
 
Foi então que Meirim, para o moralizar lhe disse para estar tranquilo, que a sua hora iria chegar, pois ele era...o melhor guarda redes da Europa.
 
O “keeper” suplente abriu os olhos de espanto. Se era assim, então porque não estava a jogar?
 
Simples: porque o titular, Benje, era o melhor guarda redes do... mundo!
 
Palavra de mestre Meirim.
 
Texto escrito em 11 de Novembro de 2004, por Luís Freitas Lobo em Planeta do Futebol 

http://www.planetadofutebol.com/artigos/memorias-benje-o-melhor-guarda-redes-do-mundo
 

Colégio da Bernardete

 
 
Colégio da Bernardete
 
Aqui, em Olhão, na Rua General Humberto Delgado, continuação da Rua Diogo Cristina a partir da Avª 18 de Junho (quando se vai para actual estação da Rodoviária) foi o famoso Colégio da Bernardete, como era sumariamente apelidado o estabelecimento de ensino feminino da Dª Bernardete Romeira.

Está lá um outra chapa na porta, mas o que interessa aqui é que era um colégio exclusivamente feminino, onde uma parte substancial das filhas de médios e grandes burgueses de Olhão estudaram.
 
É assim como versão olhanense do Colégio do Alto em Faro, ou mesmo do Colégio Algarve, igualmente em Faro.

Casa do Dr. Passos Valente

 
 
Casa do Dr. Passos Valente
 
Esta é a casa do falecido Advogado farense Dr. Passos Valente, que teve escritório na Rua que vai ter ao Largo das Mouras Velhas, do lado do Teatro Lethes, em frente à entrada do campo de futebol de salão, depois parque de ambulâncias e agora não sei.
 
O rés do chão desta casa parece-me que esteve (ou está) ocupado por uma escola de línguas depois do seu falecimento.
 
É um imóvel «incerto», pelo menos, em termos de arquitectura, na minha opinião: denoto, sem ser especialista, alguma mistura de estilos que pretende ser harmoniosa e que com um pouco de esforço da parte do observador pode sê-lo.
 
Não sei qual será o seu futuro e isso será uma incógnita que só o tempo esclarecerá.
 
Fica no cruzamento da Rua Almeida Garrett com a Rua Dr. Justino Cúmano.
 

Casa dos Rapazes - Instituto D. Francisco Gomes

 
 
Casa dos Rapazes - Instituto D. Francisco Gomes
 
Esta é a casa dos rapazes, na sua vista actual. Infelizmente não consegui encontrar uma imagem dos seus tempos antigos, para contrapor, mas conheci-a de fora relativamente bem. Era uma cerca de paredes brancas com um certo ar de isolamento para o exterior, pela qual se passava sem nos determos muito porque nada era visível senão as paredes.
 
Conheci no entanto alguns dos alunos (para além daqueles de que fui colega na Escola) porque durante bastante tempo na Rua Antero de Quental, onde agora está um prédio de esquina onde moram algumas personalidades importantes da cidade, era um dormitório secundário por cujas janelas se podia ver os alojamentos repletos de beliches e assistia-se à passagem em pelotões tipo tropa dos referidos alunos que vinham ali dormir acabado o dia neste edifício e espaço (em antigo) que aqui se vê.
 
De referir que embora não tenha assistido directamente vim a saber que o falecido Sr. Emílio Vitório Santos, irmão do desenhador e intelectual Tossan, terá tido um papel decisivo para que o pessoal da casa dos rapazes passasse a ter autorização para jogar no Clube de Basquetebol de «Os Bonjoanenses» e em boa hora o fez, porque foi através dos atletas vindos da casa dos rapazes que «Os Bonjoanenses» se colocaram na cidade como referência no Basquetebol de então, só mais tarde aparecendo à tona a equipa de Basquete do Farense.
 
Como recordação ligada e tendo em atenção que a Casa Pia em Lisboa foi criada com os mesmos princípios da Casa dos Rapazes (Instituto D. Francisco Gomes) há neste site uma foto da primeira Selecção Nacional Portuguesa em Futebol, que conta com oito jogadores do Casa Pia.   

Estalagem Caíque em Olhão - Ontem e Hoje

 
 
Estalagem Caíque em Olhão - Ontem e Hoje
 
Nesta Estalagem, militava o Olhanense na Primeira Divisão tal como agora, ficavam as equipas visitantes instaladas quando iam jogar ao então Estádio Padinha.
 
Naquele tempo, fosse qual fosse a equipa, não podia ganhar ou mesmo empatar em Olhão. O ambiente olhanense era febril e um dia o Belenenses «resolveu» empatar.
 
Protestando por uma alegada falta não assinalada contra o Belenenses, esta Estalagem foi cercada e em Olhão havia dois polícias.
 
Contudo as coisas conseguiram acalmar e ao fim de algum tempo e muitas conversações lá foi permitido à equipa do Belenenses seguir até à Estação dos caminhos de ferro, onde estava estacionada um comboio expressamente fretado para o transporte dos jogadores e restante equipa técnica do BFB.
 
Quem me contou isto trabalhava no Hotel e deve haver alguma coisa escrita em jornais desportivos e não só da época.
 
As coisas mudaram muito, mesmo muito, e por volta de 77 tive oportunidade de assistir a um jogo entre o Olhanense e o seu rival regional Farense sem quase nenhuns problemas.
Só me lembro de um haver um adepto muito irritado com o Cajuda (que jogava no Farense na altura) argumentando que ele era de Olhão e que devia jogar, embora com a camisola do Farense, pelo Olhanense.
 
Mas foi um episódio, como tantos outros que ainda se vêm em qualquer lado passados que são sobre 77, cerca de 35 anos. 
 

Casa do Dr. Rocha Gomes

 
 
Casa do Dr. Rocha Gomes
 
O Dr. Elviro Rocha Gomes foi uma das personagens mais conhecidas na cidade de Faro, apesar de nem sempre ser referenciado pelos alunos do Liceu de Faro onde leccionou.
 
Era conhecido como «Alfafa» por razões que desconheço, também não sei exactamente quais as disciplinas (seguramente relacionadas com Letras ou Literatura) que leccionou, mas acredito que fosse Licenciado em Germânicas ou sua equivalente no seu tempo.
 
Fazia traduções de Alemão já após a sua reforma, onde morou então na Rua Dr. Emiliano da Costa e escreveu (a suas expensas) uma colecção razoável de livros, alguns de carácter didático e outros onde fazia ressaltar o seu sentido crítico e o seu excelente humor.
 
Viveu nesta casa, na Rua Antero de Quental, durante largos anos e não o tivesse eu encontrado na Rua Actor Nascimento Fernandes nem me aperceberia que ele tinha abandonado esta casa, agora na foto quase em ruínas, mas na altura (anos 60/70) uma habitação com algum estatuto.
 
Era uma personagem com um sentido de humor notável e um intelectual à medida algarvia com superior calibre. E por aqui ficou e fica a sua memória, como ficou e fica a de muitos outros que por não terem enveredado pela «grande capital» ficaram mais ou menos esquecidos e se vão «deixando» esquecer pelo tempo. 

Quintal do Sr. Sebarrinha

 
 
Quintal do Sr. Sebarrinha
 
Aqui neste quintal e casa anexa, como é claro, morou o Sr. Sebarrinha, antigo empregado na Drogaria (ou casa de artigos eléctricos) Arcanjo, situada no topo da Rua de Stº António, sensivelmente a seguir à Farmácia Baptista.
 
O temperamental Cavaco, conhecido electricista da cidade de Faro, ainda trabalhou lá, e eu, embora tivesse tido alguma lidação, curta, com o Cabecinha (na Gardy) pouco antes do seu falecimento, não consigo (memorialmente) fazer a ligação entre o Cavaco e o Cabecinha, pois parece-me que na altura do seu falecimento o Cavaco trabalhava para o Cabecinha (pai).
 
De qualquer forma um dia chegarei lá e como estamos a falar do Sr. Sebarrinha seria de dizer que o seu profissionalismo e competência eram reconhecidos assim como a sua capacidade inventiva. Chegou a fazer antenas de televisão acopladas a cabos de vassoura o que na altura era um acontecimento para constar.
 
Neste quintal que se vê em frente funciona no Verão uma excelente cavaqueira entre a vizinhança o que sendo facto cada vez mais raro na cidade tem tido aqui tendência a manter-se.
 
O filho do falecido Sebarrinha tem um estabelecimento na Estrada da Penha, aqui próximo, e herdou algumas qualidades do pai, ou talvez todas, fazendo reparações de aparelhagens diversas embora ultimamente se dedique mais à revenda de aparelhagens usadas.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Jorge Jesus e o Shampoo



 
 
Jorge Jesus e o Shampoo

Sabiam que o Jorge Jesus, actual treinador do Benfica, aqui com a camisola do Olhanense, quando jogava no Farense era conhecido como o «shampoo»?

Tal alcunha deve-se ao facto dele (e outros jogadores) naquele tempo e dadas as fracas condições de balneário, levarem consigo o material suplementar que julgavam necessário para o banho a seguir ao jogo ou ao treino.

Vários levavam frascos de shampoo, mas só o Jorge Jesus ganhou a alcunha, devido ao carinho e atenção que dedicava ao dito frasco de shampoo.

Assim, a sua preocupação com o cabelo (e o penteado), que todos notamos ainda hoje vem de longe, de muito longe...

A importância do pião



 
 
A importância do pião
 
Quem nunca jogou ao pião pode ter perdido momentos que seriam «imperdíveis» para a a formação pessoal em período de infância.
 
A arte de enrolar o fio, o jogar ao chão, o fazer correr para a palma da mão, o fazer rolar o máximo de tempo possível quer na mão quer colocando de novo no solo e voltar a recuperar, o levar ou dar «cantadas» no topo (operação de picar o pião do concursante perdedor) , o desgosto de sofrer uma «cantada», o prazer de dar uma «cantada» no pião do adversário, enfim...manejo e habituação no manejo de um objecto, prova de habilidade e saber, vocação ou sorte...não há mesmo nada como um pião por mais que as tecnologias de tecla e e ecrã forneçam novidades todos os dias.
 
Ninguém deveria entrar na Universidade sem passar também por uma prova de pião, isso sim, demonstrava vocação, qualidade, paciência, saber perder e saber saber ganhar, respeitar regras e assumir derrotas e vitórias.
 
Sabe jogar ao pião? Sim...então está contratado!!!
 
 

A entrada da Geral (Galinheiro) no Cine Teatro Farense

 
 
A entrada da Geral (Galinheiro) no Cine Teatro Farense e a saída geral para quem estava com pressa. Vindos da Plateia também se fumava ao ar livre, com os porteiros a vigiar, junto às portas.
 
Nunca chamei galinheiro à Geral (frequentei muitas vezes) mas aqui há anos, como achei caro o preço para ouvir o Carlos Paredes um dos responsáveis pela organização do espectáculo, meu amigo, disse-me que «se achas caro vai para o galinheiro».
 
 
Nota: Esta foto veio do José Pelica, mas por razões que desconheço o facebook não me permitiu a partilha directa. Assim, ao José Pelica o que é do José Pelica.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

O Pató era grande inventor.

 
O Pató era grande inventor. Na gravura, está a mostrar uma cataplana. Mas inventou um esquentador a álcool, num tempo em que ninguém tinha essa modernice, um frigorífico a carvão (idem), uma peça para evitar que o leite a ferver derramasse, e outras. Chamavam-lhe "ingenheiro". Já naquele tempo...
Tinha a oficina na Avenida e não havia ninguém que não conhecesse, pelas invenções e pelo ar sebento que sempre apresentava, dos óleos e das ferramentas.
Tinha a oficina na Avenida do Liceu.
 

O famoso cão Merdock



 
 
O famoso cão Merdock, que o nosso amigo Vieira Calado, imortalizou por escrito numa obra memorável cujas reedições se sucedem, é inicialmente «bife» mas pela força da memória tornou-se essencialmente um animal de toda a cidade de Faro, do Algarve e por esse país fora e no estrangeiro onde haja uma pessoa que dele tenha tido conhecimento.
 
Eu, miúdo, talvez com os meus sete ou oito anos, tive a honra de assistir ao desfile de protesto da estudantinada na Rua José de Matos, atrás da carroça dos cães, que se dirigia então ao canil, salvo erro já na Horta da Areia e guardo na minha memória que, em pleno período salazarista, com uma Pide feroz, um cão, adoptado por todos, esteve na origem do maior protesto colectivo jamais visto até aí em Faro.
 
Talvez a memória do Merdock devesse agora reviver...
 
Na foto (do Vieira Calado) vêm-se três amigas e o Merdock na estátua do Infante. http://merdock-litoral.blogspot.pt/

Morris 850

 
Estes carrinhos fizeram furor...quase toda a gente queria ter um. Mas aqui temos outro aspecto a ver...é que a publicidade é dirigida à mulher como compradora.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Bom filme na Esplanada de S. Luís (anos 60)

Bom filme na Esplanada de S. Luís (anos 60)
Ao ver uma imagem da Antiga Esplanada do Cinema de S. Luís em Faro, mais tarde substituída por um conjunto de imóveis, lembrei-me (em alturas da Grândola, Vila Morena) que tinha eu aulas com o Zeca Afonso, na Escola Industrial e Comercial de Faro, quando entre as conversas que se iam tendo ele anunciou que ia passar nessa Esplanada (estávamos em meia estação, Junho ou Julho) o Filme «A Ilha Nua».
Fiz uma recolha sobre este filme, que já tinha procurado há meses sem o conseguir encontrar (faltava-me o nome do realizador - o japonês Kaneto Shindô) e abaixo deixo essa nota com link para o vídeo com o filme completo, mas antes gostaria de referir como foi recebido esse filme pela «crítica» farense.
Quem vive ou viveu em Faro sabe que havia uma clientela constante no (s) cinemas. Os dois que havia eram do mesmo proprietário, salvo erro Castello Lopes gerida pelo saudoso poeta e senhor da cultura farense Marques da Silva (Marmelada).
Assim essa clientela «certa» ia ver tudo o que era filme (ainda fiz isso uns quantos anos também) uma vez que a televisão era ainda rara, os programas eram pouco atractivos, enfim... e o Cinema (como local) era um excelente meio de convívio: antes dos filmes, nos intervalos e depois dos filmes.
Pois bem, os «intelectuais» bebiam o filme como mandava a praxe (mesmo que não gostassem) e os habitués protestavam contra o dito. Bem, de esclarecer que a história era interessante e já a conto lá mais para a frente, mas o filme tinha um problema que era a ausência de diálogos, ou seja, era um filme em que a única coisa que se ouvia era o ruído de fundo: do mar, do chocalhar dos baldes, do barco, enfim, os dois personagens, marido e mulher, não diziam uma palavra entre si. Dedicavam-se à sua faina por inteiro.
Ora a faina era plantar arroz numa ilhota (nua - daí o nome do filme) que não tinha água. Esta era transportada em baldes dentro de um bote, retirada nos baldes e levada a regar os pés de arroz que se estendiam por uma encosta. Todo o filme retratava isso, o dia a dia do casal, que não fazia mais nada de manhã à noite. Salvo erro nem se vê eles a comer...mas aqui passo à visão do filme.
A parte «moral» tinha lugar no fim, em que o marido ia entregar uma parte do arroz colhido ao proprietário da Ilha. O que eu me lembro bem de ter notado é que as pessoas não protestavam (aquelas que protestavam) contra a lentidão e as repetições das cenas, mas sim pelo filme não ter «palavras = diálogos».
Aconselho este filme, tendo em atenção saber-se que o cinema japonês desde há muitos anos (este filme é dos anos 60) dá cartas em termos de qualidade e inovação.
Daniel Teixeira
«A Ilha Nua», do cineasta japonês Kaneto Shindô.
O filme apresenta a rotina de uma família de pescadores que habita uma das ilhas do oeste do Japão, lugar de belas paisagens e também de desafios para a sobrevivência da família como a escassez de água e alimentos.
Apresentando nuances de documentário, “A Ilha Nua” apresenta uma poesia visual da vida do homem simples em meio às adversidades da natureza, tudo isso junto com uma trilha incidental que ganha destaque devido à ausência de qualquer diálogo no filme.
“A Ilha Nua” venceu o Festival de Moscou e foi candidato ao BAFTA, maior prêmio do cinema inglês. É um clássico do cinema japonês feito pelo diretor de “Onibaba, A Mulher Diabo”, que marcou toda uma geração de cinemaníacos no início dos anos 60.

Filme completo aqui (1h 36 m)

As outras figuras típicas

As outras figuras típicas
Há dias, bastantes, passei por um blogue de Coimbra e acabei por me deter um pouco mais: o meu objectivo era encontrar figuras típicas algarvias e entre elas o Gaiana e outros, que fizeram parte da história da cidade de Faro. Fui ter a Coimbra chamado por uma imagem na google e por ali fiquei preso durante o tempo necessário pela reflexão do titular do Blogue «Questões Nacionais», Luís Fernandes.
O chavão de que as palavras são como as cerejas aplica-se usualmente nestes casos, mas o texto do Luís Fernandes chamou-me a atenção para uma outra perspectiva daquilo que faz entrar dadas pessoas dentro da denominação de «figuras típicas» sem que o sejam de facto, não porque não façam parte do ambiente citadino, não porque por exclusão de partes as tenhamos de englobar nesta denominação, mas porque, «simplesmente» não são figuras naquele sentido activo do termo, não sobressaem, não se fazem notar. E é disso que o Luís Fernandes fala e cuja dissertação eu vou aproveitar.
Relata o autor dois casos que são interessantes, dentro desta semi - trágica situação que é a vida em sociedade. Vou ser um pouco mais longo do que previ ao começar este texto mas interessa referir que este autor no seu blogue analisa o número de visitas ao seu Blogue de acordo com estes eventos que noticia, tentando demonstar uma plausível tese, de que «aqueles que da lei da sombra se não libertam em vida acabam por libertar-se dela após a sua morte.»
Cito
a) (...) Há um ano, na data de 26 de junho, faleceu o Luís Miguel, mais conhecido entre nós por «Aspirante» – o Luís tinha 40 anos quando num estúpido acidente adormeceu na berma do Mondego e, segundo o pai Max, veio a cair no rio. Era tratado pela alcunha de «Aspirante» precisamente porque fora a patente que tivera enquanto cumprira o serviço Militar.
Enquanto decorria o tempo de tropa viera a sofrer um grave desastre, em que faleceu um seu amigo. Pelos danos causados, nunca mais recuperaria o senso. Durante muitos anos vagueou pela cidade. Aparentemente, não desencadeava exteriorizações de extraordinário afeto. Parecia ser apenas mais um personagem que deambulava pelas ruas estreitas e largas do casco urbano de uma cidade velha.

Quando, nessa altura, escrevi a crónica a anunciar o seu precoce desaparecimento, para além de ter recebido mais de uma vintena de comentários dolorosos e a lamentar a sua morte, só nesse dia tive 8438 visitas aos textos que reportavam a sua passagem entre nós – a média diária de visitantes assinalados anda por volta de 500.
b) (...) Há dias escrevi sobre a morte súbita do Adelino Paixão, noticiada pelo jornal Diário as Beiras - o Paixão, tal como o Luís Miguel, era mais uma figura típica da Baixa que, também na aparência, poucos lhe ligavam. Nesse dia, abruptamente, o blogue disparou também o contador de visitas.
(Fim de citação)
A reflexão do autor sobre este facto estende-se por planos que agora aqui não cabem, tal como a nossa atitude perante o outro (o ignorado) e a nossa visão no outro (ignorado) daquilo que nós poderiamos ser e não somos, pelo que aconselho vivamente uma leitura do texto completo aqui .
Ora bem, e regressando ao fulcro da minha questão, eu fiz uma pesquisa, sobre as figuras típicas e encontrei referências a algumas que andaram aqui por Faro, tal como o Gaiana, O Menino Chico, O Tóki. Contudo não encontrei uma única referência ao «Marrequinho da Chaveca».
Certo que ele faleceu cedo, para quem tem memória dele eu teria talvez os meus dez anos ou pouco mais ou pouco menos. Não era, por aquilo que me fui lembrando uma figura extremamente popular, mas andava por aí, pela cidade.
Depois soube-se do seu falecimento em cirunstâncias horrorosas, num daqueles crimes que agora são juridicamente apelidados de horrendos. Apareceu na Chaveca (arredores de Faro) onde vivia numa ruína enforcado numa árvore, enfiado dentro de uma saca de juta, assassinado provavelmente por alguma «brincadeira» daquelas que por vezes são notícias nos jornais quando se trata de dementes ou pessoas com poucas capacidades.
Não foi morto (enforcado) e colocado dentro da saca: foi enforcado dentro da saca. Nunca se soube quem terá (terão) sido o (s) assassino(s) e duvido que naquela altura houvesse grande preocupação das entidades responsáveis para levar longe o inquérito. Afinal sempre era um «zé ninguém»...
E por aqui me quedo com uma reflexão sobre as reflexões do eu e do outro e do outro de nós mesmos: o que levou ao anonimato quase total do «Marrequinho da Chaveca»? Enquanto viveu muitos reparam nele, não era uma daquelas personagens descritas acima pelo Luís Fernandes.
Faleceu em circunstâncias marcantes. Não vi quem falasse nele. Talvez, penso eu,  porque o mais marcante na vida dele tenha sido a forma como morreu.
Paz à sua alma...

Ver e ouvir - Crónica de Daniel Teixeira

Ver e ouvir - Crónica de Daniel Teixeira
 
Eu sei que não é muito próprio estar sentado num café, ou em qualquer lugar, e ouvir a conversa que se passa entre os habitantes da mesa ao lado. Deve-se fazer ouvidos de mercador, de um mercador de silêncios, deve-se fazer de conta que não se ouve, mas ouve-se na mesma e as palavras ditas logo ali ao lado entram-nos pelo espírito dentro, sentam-se na cadeira da nossa existência e lá conquistam o seu lugar cativo.
Em certo sentido acabamos por fazer parte da conversa que se passa ao nosso lado, se disso não formos distraídos por outras coisas que consideramos mais importantes, emitimos interiormente aprovação ou desaprovação sobre aquilo que é narrado e criamos a nossa opinião. De meros ouvintes, consoante o teor e o interesse da conversa, passamos a ser actores nela, só que seremos sempre actores passivos. Ou pelo menos é desejável que assim seja...
Não se tendo passado num café o que vou contar a seguir, quero mostrar como é fácil, por vezes, passar-se de espectador a actor e em certo sentido apropriarmo-nos do próprio palco.
Cinema de Santo António em Faro (Já demolido)

Vem-me à memória agora um filme do Joselito «Coração de Ouro» que eu vi no defunto Cinema de Santo António, em Faro, que apresentava uma cena em que o na altura jovem Joselito vinha, já noite, após ser abandonada à sua sorte ao que me lembro, de uma travessia longa de dias de um território deserto, tropeçando com o cansaço, cheio de sede e fome e encontrou um cowboy que à volta de uma fogueira assava no espeto aquilo que parecia ser um coelho. 
Era pouco falador o cowboy e respondeu com um resmungo às boas noites do miúdo (acho que em termos cinematográficos ele representou um miúdo até aos vinte e tal anos) e o Coração de Ouro acabou por se sentar no chão perto dele e ficar a olhar com a pouca água que deveria ter no corpo a escorrer pela boca. Os minutos passaram-se e o cowboy não desatava nem comida nem água para o quase prostrado Joselito que de vista turvada já só via coelhos flamejantes a correr pela pradaria.
Demorou tempo, o cowboy estava numa de brincadeira, talvez testando a resistência do ocasional colega até que este lhe pedisse alguma coisa: água e comida (um pouco daquele coelho assado que estava logo ali, de preferência). E o Joselito, de cara esmolar mas em dizer palavra, olhava para o cantil e para o coelho que rodava no espeto, seguia milímetro a milímetro o percurso da faca do cowboy que com minúcia retirava finas fatias de carne e as levava à boca, mastigava-as, engolia, bebia um gole de água e ainda por cima fazia estalar a língua de prazer.
Esta comovente e sádica cena deixou o público de lágrimas nos olhos por muito tempo. Até que um habitante da plateia, não se contendo mais, se levantou e em voz bem alta, implorando e vociferando soltou um sonoro: «Dá comida ao miúdo, meu grande c...».


Claro que o drama joselitiano continuou só na tela: ninguém mais se interessou por ela; o homem, o actor do momento, o homem da hora, estava na plateia, logo ali, recebia até aplausos, embora houvesse no ar uma grande sensação de gozo.
Os verdadeiros actores estavam agora todos na plateia e o drama passou a comédia num ápice. E eu vi, naquela noite, aqui em Faro, em dois minutos as Origens da Comédia enquanto que Nietzsche teve de fazer um livro de razoável volume para descrever as Origens da Tragédia.
E o Joselito poderia ter tragicamente baqueado ali, logo nas nossas costas, à vontade do realizador que isso passou a ser indiferente.
Daniel Teixeira
Crónica

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Côca, Biuco e Capelo

Côca, Biuco e Capelo
 

 
A Côca, o Biuco e o Capelo são três trajes de diferentes regiões, Alto Alentejo, Algarve e Ilha Terceira (Açores), no entanto, apesar da distância geográfica existem muitas semelhanças entre eles e uma história comum.
 
 
Sabemos hoje que os etruscos e os gregos vestiam o himation, ou seja, o manto, com o qual cobriam a cabeça. Possivelmente imitavam um costuma mais antigo. O Cristianismo adoptou para a imagem da Virgem o uso do manto à moda etrusca, isto é, sobre a cabeça. São Paulo introduz o costume das mulheres cobrirem a cabeça para que se distingam das mulheres descobertas ou meretrizes. Entrar na igreja com a cabeça coberta era sinal de respeito, submissão e humildade perante Deus.
 
Por toda a Europa surgiram diversas peças de vestuário que cobriam por inteiro o seu utilizador(a), nomeadamente, em França, Alemanha, Dinamarca, Itália, Espanha e Portugal.
Não se sabe quando este tipo de indumentária foi introduzido em Portugal, no entanto, podem-se encontrar registos da sua utilização desde 1609, no reinado de Filipe II, e existem autores que defendem a sua origem árabe.
 
Sabe-se no entanto, que a sua utilização abrangia a quase totalidade do território nacional, mas apenas no Alto Alentejo, no Algarve e nos Açores, esses trajes eram ainda utilizados até meados do século XX.
 
A sua utilização destinava-se a impedir o contacto da mulher com os transeuntes que com ela se cursassem na rua, ocultando a sua identidade. Para além de isolar a mulher do mundo exterior, permitia-lha também alguma liberdade, já que não sendo identificável podia movimentar-se livremente oculta dos olhos castradores da moralidade alheia.
 
 
O que são a Côca, o Biuco e o Capelo?
 
 
Estes três trajes femininos possuem pequenas variações, ou particulares alterações regionais, no entanto, a sua forma elementar baseava-se numa mantilha, com ou sem véu, amplamente distribuída, de norte ao sul do país, e que teve a generalizada denominação de biôco (ou biuco no Sul e rebuço no Norte).
 
 
Genericamente compõe-se de uma capa, mais amplas e compridas nos Açores e Algarve que no Alentejo, em cuja cabeça era coberta de forma a impedir que se visse a cara da sua utilizadora.
 
 
É a forma como a cabeça é coberta que distingue os três trajes.
 
 
 
 
 
Côca –Alto Alentejo
 
 
As côcas terão sido um traje de noiva na nossa região, na segunda metade do século XIX. A tradição oral também afirma que a dimensão e colocação do véu tinha três posições distintas, consoante a classe a que pertencia a nubente.
 
Mas, como traje de noiva acabou por cair rapidamente em desuso enquanto tal, passando a ser fundamentalmente moda nas mulheres aristocratas ou da alta burguesia de todas as idades, quando estas saíam à rua para assistir a actos religiosos ou nas visitas, tão habituais nestas classes sociais entre finais do século XIX e princípios do XX.
 
Usavam uns biôcos, pegados a uma espécie de capa curta e que eram cobertos, no alto, por uma renda larga, que caía pelas costas. Na frente o biôco era armado em papelão, ou tarlatana, para se manter aberto. Em alguns, a renda era colocada, como já disse, caindo do alto da cabeça sobre as costas, outros porém, era posta em sentido contrário, isto é, sobre a cara. Completava o trajo uma saia de merino.
 
José Leite de Vasconcellos, observa que este seria o «trajo clássico de se ir à festa do Sacramento, que durava de quinta-feira do Corpo de Deus até à segunda-feira seguinte». O célebre investigador apresenta uma testemunha ocular que, entre os anos de 1862 e 1866, terá visto as mulheres assim embiocadas, e explica que este processo só era possível mediante a utilização de «um papelão curvo que encobria a cabeça, como as mantilhas de Mondim, coberto de preto e com pano nas costas».
 



 
O biôco (ou biuco) – Algarve
 

Raul Brandão escreve a propósito do biuco no seu livro "Os Pescadores", em 1922:
" Ainda há pouco tempo todas (as mulheres de Olhão) usavam cloques e bioco. O capote, muito amplo e atirado com elegância sobre a cabeça, tornava-as impenetráveis.
 
É um trajo misterioso e atraente. Quando saem, de negro envoltas nos biocos, parecem fantasmas. Passam, olham-nos e não as vemos. Mas o lume do olhar, mais vivo no rebuço, tem outro realce... Desaparecem e deixam-nos cismáticos. Ao longe, no lajedo da rua ouve-se ainda o cloque-cloque do calçado - e já o fantasma se esvaiu, deixando-nos uma impressão de mistério e sonho. é uma mulher esplêndida que vai para uma aventura de amor? De quem são aqueles olhos que ferem lume?... Fitou-nos, sumiu-se, e ainda - perdida para sempre a figura -, ainda o som chama por nós baixinho, muito ao longe-cloque..."
 
Trata-se de uma capa que cobre inteiramente quem a usava. A cabeça era oculta pelo próprio cabeção ou por um rebuço feito por qualquer xaile, lenço ou mantilha. As mulheres embiocadas pareciam “ursos com cabeça de elefante”
 
Oficialmente a sua extinção ocorreu em 1882 e por ordem de Júlio Lourenço Pinto, então Governador Civil do Algarve, foi proibido nas ruas e templos, embora continuasse a ser usado em Olhão até aos anos 30 do século XX em que foram vistos os últimos biocos.
 
 
 
 
 
O Capelo – Açores
 
 
À semelhança de outras regiões também a mulher açoriana usava agasalho capotes com capelo, diferindo o seu feitio de ilha para ilha.
 
Leite de Vasconcelos visitou os Açores no Verão de 1924 e testemunhou o uso de mantos e capotes pelas mulheres da ilha Terceira e do Faial. Com efeito até meados do século XX era frequente encontrar nos meios citadinos mulheres envoltas no seu capote preto e capelo armado.
 
Convém distinguir o manto do capote, o primeiro é uma saia comprida e rodada de cor preta, o segundo, afigura-se como uma capa muito ampla, mais farta lateralmente que nas costas.
 
No caso da utilização do manto, o capelo era armado com cartão e atado pela cintura, a mulher segurava-o com as mãos de modo a encobrir o rosto. Com o capote, o capelo era utilizado sobre os ombros. Neste caso, estamos perante um amplo capuz suportado por um arco de osso de baleia, sendo a sua rigidez conferida pelo forro de cânhamo.
 
 
Estamos assim perante três trajes, que para além da sua função de abafo, remete o papel da mulher para a total exclusão da sociedade, uma vez que, completamente coberta jamais alguém descobriria a sua identidade.
 
 
Dos três trajes apenas o dos Açores é ainda hoje identificado pelo público em geral, já que se tornou num símbolo dessa região e é amplamente divulgado pelos ranchos folclóricos. Quanto aos restantes, correm o risco de caírem no esquecimento e no ostracismo, já que não sendo bonitos ou ricos, não são mostrados pelos grupos das suas regiões de origem.
 
 
Bibliografia:

 
PITA, António, Côca ou Mantilha - Século XIX - Uma Traje de Festa e de Solenidade do Alto Alentejo – Câmara Municipal de Castelo de Vide, Secção de Arqueologia, Maio1999

Braz Teixeira, Madalena, Trajes Míticos da Cultura Regional Portuguesa, 1994, Museu Nacional do Traje.
 
Ormonde, Helena, in O Traje do Litoral Português, Museu Etnográfico e Arqueológico Dr. Joaquim Manso, Câmara Municipal da Nazaré
 

 
Publicada por Carlos Cardoso